Nós não temos somente nos esquecido de Deus, mas temos nos rebelado contra Ele. Temos assaltado o Altíssimo. Se conhecemos qualquer coisa que nos faça lembrar de Deus, estamos prontos a odiarmos; temos desprezado Seu povo, temos chamado-os de santarrões, de hipócritas. Temos menosprezado Seu dia; Ele o separou intencionalmente para o nosso bem, e este dia temos tomado para os nossos próprios prazeres e trabalhos em vez de consagrá-lo a Ele. Ele nos deu um livro como uma prova de amor, e deseja que o leiamos, porque este livro está cheio do Seu amor para conosco; e o temos guardado perenemente fechado até as aranhas tecerem suas teias ao redor de suas fohas. Ele abriu uma casa de oração e nos convidou para irmos lá, para falar-nos ali desde Seu trono de misericórdia; porém nós temos frequentemente preferido o teatro à casa de Deus, e o escutar qualquer coisa antes que a voz que nos fala desde o céu.
Ah, meus amigos, novamente vos digo que nunca houve um homem tratado pelos seus semelhantes, até mesmo o pior dos homens, tão mal como Deus tem sido, e todavia enquanto os homens têm maltratado-O, Ele ainda continua a abençoá-los; Ele tem colocado fôlego nas narinas do homem, até quando este LHE tem amaldiçoado; Ele tem dado alimento para ele comer até quando este tem gasto a força de seu corpo em guerra contra o Altíssimo; e no próprio Domingo, quando tu tem estado quebrando Seus mandamentos e gastando o dia em suas próprias luxúrias, é Ele que tem dado luz aos teus olhos, fôlegos para os seus pulmões, e força para seus nervos e tendões; abençoando você enquanto tu LHE amaldiçoa. Oh! que consolo saber que Ele é Deus e não muda, se não nós, os filhos de Jacó, teríamos sido consumidos à muito tempo atrás, e justamente também.
Imaginem uma pobre criatura morrendo em uma fossa. Não creio que tal coisa aconteça neste país; mas se tal coisa ocoresse, se alguém que fosse rico subitamente se tornasse pobre e todos os seus amigos lhe abandonassem; e se quando ele pedisse pão ninguém lhe ajudase, até que finalmente, e sem sequer um trapo para se cobrir, seu corpo maltratado fosse lançado vivo em uma fossa. Isto, eu creio, seria o extremo do menosprezo humano à humanidade; mas Jesus Cristo, o Filho de Deus, foi tratado mais perversamente do que isto. Seria mil vezes mais misericordioso para com Ele, se eles O tivessem permitido morrer desamparado em uma fossa; mas a natureza humana não tem sido tão boa assim. Ele teve que conhecer o ápice da maldade humana, e portanto Deus permitiu que os homens se apoderassem de Cristo e o cravassem no madeiro. Ele permitiu que O colocassem dependurado no madeiro e que zombassem de sua sede oferecendo-LHE vinagre, e que ridizularizassem e desprezassem o extremo de Suas agonias; Deus permitiu que os homens fizessem dEle um objeto de risos e desdém, e que olhos lascivos e cruéis comtemplassem o seu corpo rasgado e despido.
Oh! opróbio da humanidade: nunca houve alguma criatura tão perversa como o homem. As próprias bestas são melhores do que ele, porque o homem tem os piores atributos delas e nenhum dos seus melhores. Ele tem a ferocidade do leão sem sua nobreza; tem a teimosia de um asno sem sua paciência; tem toda a gula devoradora de um lobo, sem a sabedoria de evitar as armadilhas. Ele é um abutre ávido por cadáver, porém nunca está satisfeito; ele é a própria serpente com o veneno de áspide debaixo de sua língua, porém expele seu veneno tanto perto como longe. Ah, se você julgasse a natureza humana por sua forma de tratar a Deus, verdadeiramente reconheceria que é demasiada má para poder ser remendada, e que é necessário ser feita de novo.
Novamente, há outro aspecto sobre o qual podemos considerar a malignidade da natureza humana: o seu orgulho. Está é a própria frase que demostra a maldade do homem - que ele é tão orgulhoso. Amado, o orgulho está entrelaçado na própria trama e urdume de nossa natureza, e não nos desfaremos dele até que sejamos envoltos em nosso sudário. É surpreendente que quando estamos em nossas orações - quando tentamos fazer uso de expressões humildes, somos denunciados pelo orgulho. Me aconteceu isto outro dia, quando me encontrava de joelhos, fazendo uso de uma expressão como esta: "Oh Senhor, me afligo diante de Ti; oxalá não tivesse sido tão pecador como tenho sido. Oh, se nunca me revoltasse e rebelasse como tenho feito". Aí estava o orgulho; porque, quem sou eu? Por que me lamentava? Eu deveria saber que eu era tão pecador que não era anormal ter me extraviado anteriormente. A maravilha era que eu não tinha chegado a ser tão mal devido a Deus, e não devido a mim mesmo. De forma que quando tentamos ser humildes, podemos estar imprudentemente precipitando no orgulho. Que coisa estranha é o ver um tão culpado e miserável pecador orgulhoso de sua moralidade!; e apesar disto, é algo que encontramos todos os dias. Um homem que é um inimigo de Deus, orgulhoso de sua honestidade, e não obstante roubando a Deus; um homem orgulhoso de sua castidade, e todavia se olhamos para os seus pensamentos, eles estão cheios de lascívia e impureza; um homem orgulhoso do louvor de seus companheiros, enquanto ele próprio é censurado por sua consciência e pelo Deus Todo-Poderoso. É uma coisa espantosa e estranha pensar que o homem possa ser orgulhoso, quando ele não tem nada de que se ufanar. Um pedaço de barro vivo e animado - poluído e corrompido, um inferno vivente, e contudo orgulhoso. Eu, um filho bastardo daquele que roubara o jardim de ouro de seu Mestre, daquele que se desviou e não quis ser obediente; daquele que desprezou tudo quanto tinha pelo vil valor de uma maça !; e ainda assim orgulhoso de minha ancestralidade ! Eu, que vivo da caridade diária de Deus, orgulho de minha riqueza, quando não tenho um centavao para me abençoar, a menos que Deus decida dá-lo a mim ! Eu, que vim nu a este mundo e nu sairei dele ! Eu, orgulhoso de minhas riquezas - que coisa estranha ! Eu, um novato selvagem, um ignorante que nada sabe, orgulhoso de minha sabedoria ! Oh, que coisa estranha é que esse néscio chamado homem se entitule a si mesmo de doutor, e se faça mestre de todas as artes quando não o é de nenhuma, e é muito mais tolo quando crê que sua sabedoria alcançou o mais alto grau. E oh, o mais estranho de tudo é que este homem que tem um coração enganoso - cheio de todos os tipos de concupiscências, e adultério, idolatria, e luxuria, se atreva a dizer que é uma excelente pessoa, e que se ensorbebeça crendo que, porque reúne algumas boas qualidades, é digno da veneração de seus semelhantes, se não da consideração do Altíssimo. Ah, a natureza humana, esta é tua própria condenação: orgulhosa, quando não tem do que se gloriar. Escreva "Ichabod" [N.T.: 'onde está a glória?' ou 'a glória se foi'] sobre ela. A glória se foi para sempre da natureza humana. Rupudiemo-la, e que Deus nos dê uma nova, porque a velha jamais poderá ser melhorada. Ela está irremediavelmente insana, decrépita e corrompida.
Além do mais, é totalmente certo que a natureza humana não pode ser melhorada, porque muitos têm tentado, mas sempre com fracasso. Um homem, tentando corrigir a natureza humana, é como alguém tentando mudar a posição de um monstravento, girando-o para o este quando o vento está soprando para o oeste; e quando tirar as mãos dele, tornará de novo a sua posição anterior. Tenho visto alguns que tratam de restringir sua natureza - pessoas de temperamento colérico, que tentam se consertar um pouco e conseguem, porém em seguida volta a aparecer, já que se o fogo não arde normalmente, nem as chamas encontram saída, queima seus ossos até se tornarem brancos com o calor da malícia, deixando em seu coração um resíduo de cinzas de vingança. Tenho visto um homem tentando se fazer religioso, e que monstruosidade ele faz consigo mesmo ao tentar fazê-lo, porque suas pernas não são iguais e caminham manquejando no serviço de Deus; ele é uma criatura deformada e rude, e todo aquele que olha para ela descobre logo a inconsistência de sua profissão. Oh! asseguramos que é em vão para tal homem tentar se parecer branco, bem como para o Etíoipe pensar que pode fazer sua pele se parecer branca pela aplicação de cosméticos sobre ela, ou para o leopardo pensar que suas manchas podem ser limpas; que tal homem nunca imagine que pode cancelar a ruindade de sua natureza por esforços religiosos.
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