Eu percebi que no Evangelho de João, "crer" pode ser um ato falso ou deficiente que não salva. Por exemplo, João diz: "enquanto [Jesus] estava em Jerusalém, na festa da Páscoa, muitos viram os sinais miraculosos que ele estava realizando e creram em seu nome" (2.23). Há uma advertência aqui de que esse "crer" pode não ser fé salvífica. Está baseado na expressão "viram os sinais miraculosos". Isso não é mau em si mesmo, especialmente por Jesus ter dito: "Creiam em mim quando digo que estou no Pai e que o Pai está em mim; ou pelo menos creiam por causa das mesmas obras" (João 14.11). A verdadeira fé pode vir por meio da observação dos milagres de Jesus. Mas o perigo é que algumas pessoas estavam se empolgando meramente com o poder de Jesus e seu potencial para derrubar os romanos. Jesus rejeitou esse tipo de entusiasmo: "Sabendo Jesus que pretendiam proclamá-lo rei à força, retirou-se novamente sozinho para o monte" (João 6.15). E o próprio João disse que os irmãos de Jesus, que acreditaram no poder milagroso de Jesus (João 7.3,4), e provavelmente na sua reivindicação de ser o Messias, não obstante não "criam nele" (João 7.5).
Assim, quando João disse: "muitos creram em seu nome" (2.23), pois viram os sinais que ele estava fazendo, somos advertidos de que esse "crer" pode ser uma persuasão baseada no poder dele, mas que não alcança o cerne de quem ele é. Aliás, este aparentemente é o caso desses "crentes". Pois o versículo seguinte afirma: "Mas Jesus não se confiava a eles, pois conhecia a todos" (2.24). Em outras palavras, o que estava no interior não correspondia à profissão exterior. Sua "fé" era, como diz Charles K. Barrett, "a aparência da fé".2 Ou, como diz Leon Morris: "Não é nada mais que um começo".3Contudo, é vagamente chamado "crer".
Encontramos a mesma deficiência de fé em João 8.31-37. Essa seção começa com as palavras: "Disse Jesus aos judeus que haviam crido nele..." (João 8.31). Mas antes do fim da seção, Jesus diz a esses mesmos judeus: "Eu sei que vocês são descendentes de Abraão. Contudo, estão procurando matar-me, porque em vocês não há lugar para a minha palavra' (João 8.37). Os que "haviam crido nele" estavam tentando matá-lo. Isso levou um comentarista a dizer: "Ou João escreve de forma muito relapsa ou ele quer dizer que a fé desses judeus era muito deficiente". João é tudo menos um artífice relapso. Por isso, é correto seguir a segunda opção. Nas palavras de Leon Morris: "João fala de homens que fizeram uma profissão exterior, mas que nesse caso não se aprofundou muito".
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