Uma última questão precisa ser tratada neste capítulo. Defini "amor" como o transbordar da alegria em Deus, que atende as necessidades dos outros. Para concluir, será de utilidade prática perguntar como isso funciona realmente na experiência. Como é o processo psicológico que passa da alegria em Deus à ação prática do amor?
Começamos com um milagre, a saber, eu como pecador devo alegrar-me em Deus. Não apenas em suas recompensas materiais, mas nele, em toda a sua grandiosidade multiforme! Essa experiência de conversão, como vimos, é a "criação" de um cristão que busca o prazer. E agora, como o amor prático emerge desse coração de alegria em Deus?
Quando o objeto da nossa alegria é a beleza moral, o anseio de contemplar é inseparável do anseio de ser. Quando o Espírito Santo desperta o coração de uma pessoa para ter prazer na santidade de Deus, nasce um desejo insaciável não apenas de contemplar essa santidade mas também de ser santo como Deus é santo. Nossa alegria é incompleta se pudermos apenas contemplar a glória de Deus de fora, sem permissão de participar dela. Uma coisa é um menino aplaudir os grandes jogadores numa partida de futebol. Mas sua alegria será completa se puder ir para casa, formar um time e jogar pessoalmente.
Nós não queremos somente ver a graça de Deus em toda a sua beleza, salvando pecadores e santificando santos. Queremos participar do poder dessa graça. Queremos senti-la salvando.
Queremos senti-la denotando tentações em nossa vida. Queremos senti-la usando-nos para salvar outros. E por quê? Porque nossa alegria em Deus é de uma ganância insaciável. Quanto mais você tem, mais você quer. Quanto mais você vê, mais você quer ver. Quanto mais você sente, mais você quer sentir.
Isso significa que a ganância por alegria em Deus, que quer ver e sentir cada vez mais manifestações da sua glória, induzirá a pessoa a amar. Meu anseio de sentir o poder da graça de Deus derrotando orgulho e egoísmo em minha vida induz-me a uma conduta que demonstra a vitória da graça, que é amar. O amor genuíno é tão contrário à natureza humana que sua presença dá testemunho de um poder extraordinário. O cristão que busca o prazer busca o amor porque está viciado na experiência desse poder. Ele quer sentir mais e mais a graça de Deus reinando em sua vida.
Vencendo a montanha interior do orgulho
Temos aqui uma analogia para uma motivação poderosa que existe também no coração dos descrentes. Praticamente todas as pessoas sem Cristo estão dominadas pelo desejo de encontrar felicidade vencendo alguma limitação em sua vida e tendo a sensação do poder. Heinrich Harrer, membro da primeira equipe que escalou a parede norte do monte Eiger nos Alpes suíços, confessou que sua razão para tentar essa escalada foi vencer seu senso de insegurança. "A autoconfiança", disse ele, "é o dom mais valioso que alguém pode possuir. [...] Todavia, para possuir essa confiança autêntica é necessário ter aprendido a conhecer a si mesmo em momentos em que se está no limite extremo das coisas. [...] Na 'Aranha' da parede norte do Eiger eu passei por essas situações extremas, vendo as avalanches passar sem parar por cima de nós".
O que faz toda a diferença entre quem não é cristão e o cristão que persegue o prazer nessa busca da alegria é que o cristão que busca o prazer já descobriu que a autoconfiança jamais satisfará o desejo do seu coração de vencer sua limitação.
Ele aprendeu que fomos feitos realmente não para a sensação de sentir nosso próprio poder aumentar, mas de sentir o poder de Deus aumentar — superando os precipícios do desamor em nosso coração pecaminoso.
Como eu disse na carta ao meu amigo Ronn, é uma prova de como somos mundanos o fato de sentirmos mais alegria quando conquistamos uma montanha exterior de granito com nossa própria força do que quando vencemos a montanha interior do orgulho na força do Senhor. O milagre do prazer cristão é que superar obstáculos ao amor pela graça de Deus tornou-se mais interessante que qualquer forma de autoconfiança. A alegria de experimentar o poder da graça de Deus derrotando o egoísmo é um vício insaciável.
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