Sejamos como Cristo em relação a sua disposição. Ele tinha uma disposição muito agradável. Cristo é "o deleite da humanidade", muito acima de Tito Vespasiano. Cristo convida pecadores a virem até ele. Ele tem entranhas para sentir misericórdia de nós, alimentos para nos alimentar, asas para nos cobrir. Ele nunca feriria nosso coração, mas só usaria misericórdia. Cristo foi feito a nossa semelhança? Então, sejamos como ele em doçura de disposição; não sejamos de um espírito moroso. O seguinte foi dito de Nabal: "Ele é filho de Belial, e não há quem lhe possa falar" (ISm 25.17). Alguns são tão bárbaros como se fossem amigos de avestruz, são cheios de ira e respiram nada mais que vingança, ou são como aqueles homens no evangelho: "Endemoninhados, saindo dentre os sepulcros, e a tal ponto furiosos, que ninguém podia passar por aquele caminho" (Mt 8.28). Sejamos como Cristo na mansidão e na doçura. Oremos por nossos inimigos e os vençamos pelo amor. A bondade de Davi derreteu o coração de Saul (ISm 24.16). Um coração congelado será derretido com o fogo do amor.
Sejamos como Cristo na graça. Ele foi como nós na carne, sejamos como ele na graça. Devemos nos esforçar para ser como Cristo em humildade: "A si mesmo se humilhou" (Fp 2.8). Ele abandonou as vestimentas reluzentes de sua glória para ser vestido com os trapos de nossa humanidade. Que humildade maravilhosa. Sejamos como Cristo nessa graça. "Humilhação", diz Bernardo, "é um desprezo da própria excelência", um tipo de auto-aniquilação. Essa é a glória de um cristão. Aos olhos de Deus, nunca somos tão atraentes, a não ser quando somos sujos aos nossos próprios olhos. Sejamos assim como Cristo. A religião verdadeira é imitar a Cristo. De fato, é maravilhoso ser humilde, olhar dentro de nós, para baixo de nós, acima de nós.
Quando olhamos dentro de nós, vemos nossos pecados como que no espelho da consciência: luxúria, inveja e paixões. Nossos pecados são como vermes rastejando para dentro de nossas almas: "Quantas culpas e pecados tenho eu?" (Jó 13.23). Nossos pecados são como a areia do mar, como as rochas do mar são pesados. Agostinho declara: "O meu coração, que é o templo de Deus, está poluído com o pecado".
Quando olhamos ao nosso redor, vemos algo que pode nos tornar humildes. Vemos outros cristãos se sobressaindo em relação a nós com seus dons e graças, assim como o Sol se destaca em relação às estrelas. Outras pessoas são agraciadas com frutos, talvez tenhamos aqui e ali uma frutinha crescendo que manifeste adequadamente o que somos (Is 17.6).
Quando olhamos abaixo de nós, vemos alguma coisa que pode nos fazer humildes. Podemos ver a terra de onde viemos. A terra é o elemento mais vil que há: Eram mais vis que a terra (Jó 30.8).83 Você que mostra sua insígnia e refulge seu brasão, olhe bem qual é a sua origem. Você é formado somente por cinzas ambulantes. Por que você é tão orgulhoso? O que foi Adão? O filho do pó da terra. E o que é o pó? O filho do nada.
Quando olhamos acima de nós, também vemos algo que pode nos fazer humildes. Olhando para o céu se vê Deus resistindo ao orgulhoso. Deus persegue o orgulhoso para se vingar. O homem orgulhoso é o alvo no qual Deus atira e nunca erra. Deus lançou o orgulhoso Lúcifer para fora do céu. Ele tirou o orgulhoso Nabucodonosor de seu trono e o fez comer grama (Dn 4.25). Sejamos como Cristo na humildade.
Cristo tomou nossa carne? Ele foi feito como nós? Sejamos como ele no zelo: "O zelo da tua casa me consumirá" (Jo 2.17). Ele foi zeloso quando tentaram desonrar seu Pai. Sejamos também como Cristo nisto, zelosos para com a verdade e a glória de Deus que são as duas pérolas orientais da coroa do céu. O zelo é tão necessário para o cristão quanto o sal ou o fogo do altar para o sacrifício. O zelo sem a prudência é insensatez, prudência sem zelo é covardia. Sem o zelo nossos serviços não são aceitáveis
a Deus. O zelo é como a resina para os fios do violino, sem os quais o músico não produz a música.
Seja como Cristo em relação ao desprezo ao mundo. Quando Cristo tomou nossa carne não veio no orgulho dela, não veio de uma descendência imediata de reis e de nobres, mas de uma parentela simples. Cristo não tinha ambição de títulos ou de honra. Ele os declinou com a grandeza mundana na mesma intensidade que outros os buscam. Quando poderia se fazer rei, ele o recusou. Ele preferiu cavalgar nas costas de um burro que ser levado em uma carruagem, preferiu ser pendurado numa cruz de madeira que usar uma coroa dourada. Ele rejeitou a pompa e a glória do mundo. Ele abriu mão de assuntos seculares: "Quem me constituiu juiz?" (Lc 12.14). Sua obra não era arbitrar em questões da lei, veio ao mundo não para ser um magistrado, mas um redentor. Ele era como uma estrela em uma órbita mais alta, importava-se somente com o céu. Cristo foi feito como nós? Sejamos como ele, apegados aos céus e não ao mundo. Não sejamos ambiciosos de honras e de vantagens do mundo. Não compremos o mundo com a perda da boa consciência. Que sábio gostaria de perder a sua alma para ficar rico? Quem jogaria sua alma no inferno a fim de construir uma propriedade? Seja como Cristo em um santo desprezo do mundo.
Seja como Cristo em suas conversas. Cristo se encarnou? Ele foi feito como nós? Sejamos como ele na santidade de vida. Nenhuma tentação poderia pegá-lo: "Aí vem o príncipe do mundo; e ele nada tem em mim" (Jo 14.30). A tentação para Cristo era como uma fagulha sobre um pilar de mármore que desaparece rapidamente. "A vida de Cristo", diz Crisóstomo, "era mais brilhante do que os raios do Sol". Sejamos como ele nisto: "Segundo é santo aquele que vos chamou, tornai-vos santos também vós mesmos em todo o vosso procedimento" (IPe 1.15). Agostinho dizia que nós não temos de ser como Cristo no exercício dos milagres, mas na vida > santa. Um cristão deveria ser tanto uma magnetita quanto um diamante. Uma magnetita ao atrair outros para Cristo, um diamante ao emitir uma luz brilhante de santidade em sua vida. Sejamos justos em nossos negócios, verdadeiros em nossas promessas, devotos em nossa adoração, sem mancha em nossas vidas a tal ponto de sermos figuras ambulantes de Cristo. Assim como Cristo foi feito à nossa semelhança, lutemos para ser feitos à semelhança dele.
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