Tradução: Marina Boscato
Revisão: Felipe Sabino
Jonathan Edwards tem uma palavra para o nosso tempo, que
dificilmente seria mais penetrante se ele estivesse vivo hoje. Tem a ver com o
fundamento da gratidão.
A verdadeira gratidão ou agradecimento a Deus, por sua
bondade para conosco, surge de um fundamento lançado antes:
amar a Deus pelo que Ele é em si mesmo; enquanto a gratidão
natural não tem tal fundamento antecedente. As comoções
graciosas de afeição grata para com Deus, pela bondade recebida,
sempre procedem de um estoque de amor já presente no
coração, estabelecido em primeiro lugar sobre outro
fundamento, a saber, a própria excelência de Deus.
1
Em outras palavras, a gratidão que agrada a Deus não é, em primeiro
plano, um deleite nos benefícios dados por Deus (embora isso faça parte
dela). A verdadeira gratidão deve estar enraizada em algo que vem antes, isto
é, um deleite na beleza e na excelência do caráter de Deus. Se isto não for o
fundamento de nossa gratidão, então não está acima do que o “homem
natural” – sem o Espírito e a nova natureza em Cristo – experimenta. Nesse
caso, a “gratidão” a Deus não Lhe é mais agradável do que todas as outras
emoções que os incrédulos têm sem deleitarem-se nele.
Você não seria honrado se eu lhe agradecesse freqüentemente pelos
seus dons para comigo, mas não tivesse consideração espontânea e profunda
por você como pessoa. Você se sentiria insultado, não importando o quanto
eu lhe agradecesse por seus dons. Se o seu caráter e personalidade não me
atraíssem, nem me dessem alegria de estar na sua presença, você se sentiria
usado, como uma ferramenta ou uma máquina para produzir as coisas que eu
realmente amo.
O mesmo acontece com Deus. Se não somos atraídos por Sua
personalidade e caráter, todas as nossas declarações de gratidão são como a
gratidão de uma esposa ao marido pelo dinheiro que ela recebe dele para usar
em seu relacionamento com outro homem. Esta é exatamente a figura
1
Jonathan Edwards, Religious Affections, The Works of Jonathan Edwards, Vol. 2, New
Haven: Yale University Press, 1959, orig. 1746, p.247.
2
apresentada em Tiago 4:3-4. Tiago critica os motivos da oração que trata a
Deus como um marido de adúltera: “Pedis, e não recebeis, porque pedis mal,
para o gastardes em vossos deleites. Adúlteros e adúlteras, não sabeis vós que
a amizade do mundo é inimizade contra Deus? Portanto, qualquer que quiser
ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus”. Por que ele chama essas
pessoas que oravam de adúlteras? Porque, embora estivessem orando,
estavam abandonando seu marido (Deus) e indo atrás de um amante (o
mundo). E para piorar as coisas, estavam pedindo a seu marido (em oração)
que financiasse o adultério.
Surpreendentemente, esta mesma dinâmica espiritual deficiente é
verdadeira, às vezes, quando as pessoas agradecem a Deus por ter mandado
Cristo para morrer por elas. Talvez você já tenha ouvido alguém dizer o
quanto devemos ser gratos pela morte de Cristo, porque ela nos mostra o
grande valor que Deus nos deu. Qual é o fundamento desta gratidão?
Jonathan Edwards chama isso de gratidão de hipócritas. Por quê?
Porque,
primeiro eles se regozijam e se elevam com o fato de que são
muito estimados por Deus; e então, sobre esse fundamento,
Deus lhes parece de certa forma amável… Eles se alegram no
mais alto grau em ouvir o quanto Deus e Cristo os estima.
Portanto, o gozo deles é na verdade um gozo em si mesmos, e
não em Deus.
2
É chocante descobrir que uma das descrições mais comuns, hoje, sobre
como responder à cruz, pode ser uma descrição de amor natural por si
mesmo, sem qualquer valor espiritual.
Faremos bem em dar ouvidos a Jonathan Edwards. Ele não estava
apenas nos explicando a verdade bíblica de que devemos fazer todas as coisas,
incluindo dar graças, para a glória da Deus (Coríntios 10:31)? E Deus não é
glorificado se o fundamento da nossa gratidão é o valor do dom, e não a
excelência do Doador. Se a gratidão não está enraizada na beleza de Deus
antes do dom, ela provavelmente é uma idolatria disfarçada. Que Deus nos
conceda um coração que se deleite nele por aquilo que Ele é, para que toda a
nossa gratidão por seus dons seja o eco da alegria na excelência do Doador!
Fonte: http://www.desiringgod.org/
2
Jonathan Edwards, Religious Affections, pp. 250-251.
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