O supremo privilégio do crente é viver não "debaixo da lei, e, sim, da graça" (Rm 6.14, 15), no sentido de ter todo o seu relacionamento com Deus determinado pelo amor que o escolheu, redimiu, converteu e que o protege. Bem poderíamos encerrar nosso estudo observando algumas idéias que nos mostram quão grande é esse privilégio. A vida sob a graça é uma vida de liberdade, em três maneiras básicas:
Conforme vimos, o crente, que vive debaixo da graça, é livre da futil necessidade de tentar recomendar-se a Deus mediante a perfeita observância da lei. Agora ele vive por haver sido perdoado, e, portanto, é livre para falhar em cada aspecto da vida (como inevitavelmente o faz repetidas vezes); e, tendo falhado, é livre para levantar-se no ponto em que caiu, a fim de buscar e encontrar o perdão divino, e começar de novo. O orgulho, nossa disposição natural, que é auto-protetor, auto-justificante e cheio de vangloria, haverá de recusar-se a admitir o fracasso ou a tentar de novo, a fim de que o trauma do fracasso não se repita. Porém, a humildade do homem que vive por ter sido perdoado desconhece tais inibições. A experiência do cristão em fracassar diariamente, juntamente com o conhecimento íntimo de seus próprios falsos motivos e do registro de vergonhosas recordações, levam-no constantemente a reivindicar aquela auto-descrição de Paulo, proferida ao final de sua vida, a saber, "o principal" dos pecadores (1 Tm 1.15). Todavia, diariamente as falhas do crente lhe são perdoadas, e sua alegria é restaurada. Segundo Jesus ensinou, uma das razões pela qual devemos estar dispostos a perdoar nossos irmãos na fé vezes sem conta, é que a nossa própria vida com Deus também consiste em sermos perdoados inúmeras vezes.
Além disso, o crente, que está debaixo da graça, é livre do domínio do pecado (Rm 6.14). Devido a sua união com Cristo, que morreu e ressurgiu, e devido ao poder do Espírito que nele habita, o crente é capaz de opor-se e de resistir aos impulsos de pecar, que infectam o seu sistema moral e espiritual. E, "se pelo Espírito mortificardes os feitos do corpo, certamente vivereis" (Rm 8.13). Os feitos do corpo são os maus hábitos, de comissão ou de omissão. Assim, o crente avança na semelhança com Cristo (cf. 2 Co 3.18) e agrada ao Senhor. Paulo explica isto de modo sucinto em Romanos 6.1-8.14, ordenando suas idéias como uma resposta à pergunta: "Por que aqueles que foram justificados pela fé não devem fazer com que a graça abunde (isto é, a graça perdoadora), por continuarem a pecar como antes?" Em suma, a resposta dada por Paulo é: Não só a retidão (a observância da lei) é algo possível e prescrito para o crente, mas também é fato que nenhum crente pode continuar pecando como antes, porque a união com Cristo transformou a sua natureza de tal modo que o seu coração (o homem interior) agora deseja a retidão, tal como antes desejava o pecado; e somente a obediência a Deus pode satisfazer o seu mais profundo anelo interior. O crente odeia o pecado que encontra em si mesmo e não sente qualquer prazer nos seus lapsos de pecado. Esse é o estado mental do homem que é liberto do domínio do pecado. Ele ama a santidade porque ama ao seu Deus-Salvador e não pensaria em voltar aos dias quando, como servo do pecado, não amava nem a santidade nem a Deus. Ele sabe que a sua libertação o enobreceu e trouxe-lhe tanto o desejo como a força para viver corretamente, e, por esse motivo, sente-se eternamente grato.
Finalmente, o crente, que vive sob a graça, é livre da servidão ao medo (Rm 8.15 ss.; cf. 1 Jo 4.17, 18), a saber, do futuro desconhecido, de encontrar-se com Deus (conforme todos teremos de fazer, algum dia), de ser destruído por forças hostis, ou por qualquer tipo de amargas experiências. Ele sabe que é filho adotivo de Deus, amado, seguro, com a sua herança aguardando por ele, e com a sua alegria eterna garantida. Ele sabe que coisa alguma poderá separá-lo do amor de Deus em Cristo, ou arrancá-lo da mão do seu Salvador. Também sabe que coisa alguma lhe pode suceder que não contribua para seu eterno bem, tornando-o mais parecido com Jesus, levando-o mais perto de Deus. Assim, quando o medo invade-lhe a alma, conforme sucede às vezes a toda pessoa normal, o crente o afasta, por lembrar-se destas verdades e por repassar em sua mente a seqüência de idéias que o franco e despretencioso hino de John Newton apresenta.
A graça eterna de Jesus,
Que veio me libertar,
A mim tão grande pecador,
Oh, graça singular.
Tal graça o medo me levou
Desde o dia em que eu cri,
E bem feliz me transformou,
Tal nunca mereci.
Perigos e horrores passarei
Na peregrinação,
Mas pela graça alcançarei
Celestial mansão.
E quando no lar celestial
Por tempos sem cessar,
Louvor daremos eternal
A quem nos quis salvar.
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