Os homens e as mulheres de hoje não apreciam os processos de pensamento nem o discernimento. Quais crianças, desejam fazer o que gostam e justificam as suas ações baseando-se no fato que desejam e gostam de fazê-las. Por conseguinte, aborrecem a disciplina e o ter de enfrentar as dificuldades. Fazem objeção à inconveniência de terem de enfrentar as questões da verdade, do bem, do mal e da beleza. Fazem o que querem fazer, defendendo que a auto-expressão é algo correto. Têm apenas um padrão de valores, o do prazer. Não investigam se seu procedimento é correto e seguro, se tenderá por contribuir para o desenvolvimento de todo o seu ser, especialmente daquilo que, neles, é mais elevado e melhor. Contentam-se com este único teste: "Isto traz satisfação?"
É evidente que esse método termina revertendo ao estado da infância, ou mesmo ao da selvageria! Não é tal atitude inteiramente suicida, a julgar pelo verda¬deiro padrão da natureza humana? Se você deseja suprimir sua consciência, assassinar sua razão e abafar todo o desejo por coisas mais elevadas e nobres, que nascem em sua pessoa, e se deseja meramente satisfazer à concupiscência e paixão pelo prazer, então apele para o culto moderno da auto-expressão. Porém, se deseja que todo o seu ser se desenvolva e encontre meios de expressar-se, então considere o teste do prazer como uma sugestão feita pelo próprio inferno e aplique o outro teste.
Não há necessidade, porém, de argumentar sobre esse ponto de vista meramente segundo o plano teórico. Apliquemos o teste prático. Leiamos a Bíblia e estudemos a história de seus personagens. Leiamos as biografias dos maiores benfeitores que o mundo já viu. Examinemo-los especialmente à luz do que temos discutido. Davi, o rei de Israel, mostrou o seu lado melhor e mais elevado, quando expressou o seu verdadeiro "eu" e aplicou o teste isolado do prazer, na questão de Bate-Seba, tendo-se tornado, dessa maneira, adúltero e homicida? Estava Agostinho expondo a expressão mais verdadeira do seu "eu", quando ainda era um filósofo imoral? ou depois, quando se tornou o santo disciplinado que, metaforicamente, cortou as mãos e os pés e arrancou os olhos da concupiscência e dos maus desejos? Meditemos sobre todos os membros do nobre exército de santos e mártires, que viveram na abnegação, disciplinaram suas próprias vidas, conti¬veram e controlaram os seus impulsos e instintos e, de modo geral, obedeceram aos ensinamentos do evangelho! Comparemo-los e contrastemo-los com os sensuais libertinos e devassos da história. Qual desses dois grupos representa mais verdadeiramente o "eu", a verdadeira natureza humana?
Fazer tal pergunta já é por si um insulto. A maneira de expressar corretamente o próprio "eu" é o caminho da disciplina e da ordem, é o caminho da razão e da oração, é o caminho do ouvir a voz da consciência, encorajando cada pensamento e desejo que trazem enlevo. O mundo poderá considerar-nos uns tolos; e, do ponto de vista do mundo, certamente seremos coxos e mutilados, tendo apenas um olho, como criaturas bastante imperfeitas. Sim, como meros animais podemos parecer imperfeitos. No entanto, seremos dignos de sermos chamados "homens". Teremos um "eu" que se expressará com dignidade e que irá crescendo com o passar dos dias. "Não só de pão viverá o homem" (Lc 4.4); nem só de prazeres, por igual modo. Para viver, é mister que o ser inteiro e a natureza do homem sejam usados e exercitados. De outro modo, ele morrerá.
O argumento contra esse moderno ensino ainda não foi completamente exposto. Tal ensino ignora, descuidadamente, o destino final do próprio "eu": isto também precisa ser mencionado. Já foi esclarecido que isto é feito através de um ponto de vista meramente terreno e humano. Mas, há algo mais alto, infinitamente mais importante, que tal ensino também ignora. "Melhor é entrares na vida manco ou aleijado do que, tendo duas mãos ou dois pés, seres lançado no fogo eterno". E novamente: "Melhor é entrares na vida com um só dos teus olhos do que, tendo dois, seres lançado no inferno de fogo". Essas são palavras proferidas por Jesus de Nazaré, o Filho de Deus. No plano puramente humano, temos visto que toda essa questão da auto-expressão é extremamente degradante para o verdadeiro "eu".
Mas, além e acima disso, há o ponto de vista de Deus a nosso respeito, que é de conseqüências infinita¬mente mais profundas, por estarmos em suas mãos e ser Ele o Juiz eterno. Esse é o ponto de vista divino sobre o nosso "eu", e essa questão fica abundantemente clara na Bíblia. De fato, ensinar isto é o propósito inteiro da Bíblia. Deus conferiu ao homem uma natu¬reza e um ser semelhantes aos dEle. Criou o homem segundo a sua própria imagem. Soprou sobre o homem o hálito da vida e o tornou uma alma vivente. Essa alma é o dom de Deus para nós. É o tesouro que Ele deixou ao nosso encargo e cuidado. Esse é o "eu" que pede e espera que expressemos.
No fim da vida e do tempo, Ele julgará o nosso desempenho. O padrão do juízo será a lei moral, conforme dada a Moisés, os ensinamentos dos profetas, o Sermão da Montanha e, acima de tudo, nosso conhe¬cimento confiante que temos dEle e nossa aproximação à vida vivida por nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo. Pois a autêntica auto-expressão foi revelada em Cristo de modo perfeito, de uma vez por todas. A questão que teremos de enfrentar, por conseguinte, é esta: O que você tem feito do seu próprio "eu"? Como é que você o tem expressado? As conseqüências são eternas — vida ou morte, o céu ou o inferno.
Portanto, antes de começarmos a falar sobre a liberdade de auto-expressão, teremos de descobrir se possuímos ou não aquele verdadeiro "eu" que Deus desejou que todos os homens tivessem. Se nos faltar este verdadeiro "eu", não podemos expressá-lo e não seremos capazes de devolvê-lo a Deus, prestando contas acerca dele, no temível Dia do Juízo. A grande e urgente indagação, pois, com que cada homem se defronta, é a seguinte: Que sucedeu ao teu "eu"? tens domínio sobre a tua alma? o verdadeiro "eu" continua existente em ti? a visão e a faculdade divinas continuam presentes em ti? a tua alma continua viva? Mas, se alguém tiver vivido somente conforme os seus instintos, desejos e impulsos, o verdadeiro "eu" dessa pessoa desde há muito está morto, segundo ela poderá descobrir facil¬mente, se ao menos tentar viver a outra forma de vida e, acima de tudo, se procurar encontrar a Deus. O homem não pode reabilitar o seu verdadeiro "eu". Não pode encontrar a Deus. O homem pode perder a alma, mas não pode achá-la de volta. Pode matá-la e destruí-la, mas não pode criá-la de novo. E, se não fosse por uma única coisa, iria inevitavelmente para o fogo eterno do inferno.
Graças a Deus, entretanto, existe essa única coisa. "Porque o Filho do homem veio buscar e salvar o perdido" (Lc 19.10). Jesus de Nazaré, o Filho de Deus, desceu à terra, viveu, morreu e ressuscitou, a fim de salvar. Ele suportou o castigo que merecíamos, devido ao nosso pecado, por havermos estragado e maculado a imagem de Deus em nós. E mais, Ele restaura nossa alma para nós. Ele nos confere uma nova natureza e enche-nos com um poder que nos capacita expressar esse novo e verdadeiro "eu", tal como Ele mesmo o expressou. Essa nova forma de auto-expressão é manifesta pelo homem que é filho de Deus, agradável aos olhos do Pai celeste e herdeiro da vida eterna.
O mundo reduz o homem ao nível dos irracionais, ofende ao santo Juiz e conduz à morte eterna. A Bíblia, ao contrário, exorta-nos a desistir dos prazeres transi¬tórios do pecado e a encontrar em Jesus Cristo o nosso verdadeiro "eu". É com essa finalidade que pleiteia, junto a nós, que neguemos a nós mesmos, decepemos mão ou pé, arranquemos o olho, e façamos qualquer coisa que porventura seja necessária, a fim de que sejam servidos os melhores e mais elevados interesses desse verdadeiro "eu"; porquanto assevera que "melhor é entrares na vida manco ou aleijado do que, tendo duas mãos ou dois pés, seres lançado no fogo eterno".
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