De todo meu coração te busquei (Sl 119.10-12). Seu coração saíra em busca de Deus como tal; não só desejava obedecer a suas leis, mas também comungar com sua pessoa. Essa é  uma busca real, justa e persistente, e pode muito bem ser continuada de  todo o coração. O modo mais seguro de purificar o caminho de nossa vida  é buscando a Deus como tal e diligenciando-nos em permanecer em  comunhão com ele.
E agradável  ver como o coração do escritor se volve distinta e diretamente para  Deus. Ele estivera considerando uma importante verdade no versículo  anterior; aqui, porém, ele mais poderosamente sente a presença de seu  Deus, e lhe fala e ora a ele como alguém que se encontra bem perto. Um  coração sincero não pode viver por muito tempo sem comunhão com Deus.
Sua petição  se fundamenta no propósito de sua vida; ele está buscando o Senhor e  roga a que o Senhor não permita que ele desista de sua busca. E através  da obediência que vamos após Deus; daí a oração: "Não me deixes fugir de  teus mandamentos." Pois se desistirmos dos caminhos designados  por Deus, certamente não acharemos o Deus que os designou. Quanto mais a  totalidade do coração humano é posta na santidade, mais ele teme cair  em pecado. Ele não se sente suficientemente temeroso de cometer  transgressão deliberadamente quando não passa de um viandante  displicente. Ele não pode tolerar um aspecto displicente nem um  pensamento disperso que vagueia para longe dos limites do preceito.  Devemos ser como os que sinceramente buscam a Deus, os quais não têm  tempo nem vontade de perambular, e juntamente com nossa sinceridade  devemos cultivar um zeloso temor para não vaguearmos longe da vereda da  santidade.
Duas coisas podem ser bem parecidas e ao mesmo tempo totalmente distintas: os santos são  'peregrinos' - "Sou peregrino na terra" (v. 19) -, mas não são  andarilhos; estão de passagem pelo país dos inimigos, mas sua rota segue  em frente; estão buscando seu Senhor enquanto atravessam essa terra  estrangeira. Seu caminho não é visto pelos homens; porém ainda não  perderam sua rota.
O homem de Deus se exercita, mas não  confia em si mesmo; seu coração está em seu caminhar com Deus; mas ele  sabe que mesmo toda sua força não basta para mantê-lo no rumo certo, a  menos que seu Rei seja seu guardador; e Aquele que fez os mandamentos o fará  perseverante em obedecê-los; daí a oração: "Não me deixes fugir. “Não  obstante, tal senso de carência jamais se converteu em apologia da  indolência; pois enquanto orava para ser guardado na rota certa, ele se  precavia para percorrê-la, buscando o Senhor com todas as veras de seu  coração.
Note como a segunda oitava deste Salmo se harmoniza com a primeira: onde o versículo  2 declara que o homem, para ser bem-aventurado, deve buscar o Senhor de  todo seu coração; o presente versículo reivindica a bênção declarando o  caráter: "De todo meu coração te busquei”.
[v. 11]
Guardo no coração tuas palavras para não pecar contra ti.
Quando uma pessoa piedosa suplica pelo favor divino, ela deve criteriosamente usar todos os meios para sua obtenção;  e, conseqüentemente, como o salmista suplicara que fosse preservado de  vaguear sem rumo, ele aqui nos mostra a santa precaução que tomara para  evitar de cair em pecado. "Guardei no coração tuas palavras." Seu  coração seria guardado pela palavra, visto haver guardado a palavra em  seu coração. Tudo quanto escrevera sobre a palavra, e tudo quanto lhe  fora revelado pela voz divina - tudo, sem exceção, ele armazenara em  suas afeições, como um tesouro a ser preservado num escrínio, ou como  uma semente selecionada para ser depositada no solo fértil - que solo  mais fértil há do que um coração renovado, totalmente dedicado a buscar o  Senhor? A palavra era do próprio Deus, e por isso era preciosa ao servo  de Deus. Ele não usa a palavra sobre seu coração como um talismã, mas a ocultou em seu  coração como uma norma. Ele a deposita onde habita o amor e a vida, e  ali ela encheu as recâmaras com doçura e luz. Devemos imitar a Davi,  imitando tanto sua atitude subjetiva quanto seu caráter objetivo.  Primeiro, devemos ponderar que o que cremos é genuinamente a palavra de  Deus; isso feito, devemos ocultá-la ou entesourá-la, cada um de per  si; e é preciso que notemos bem que isso deve ser feito não como uma  proeza da memória, mas como um jubiloso ato das afeições.
Para não pecar contra ti. Eis aqui o objetivo almejado. Como disse alguém corretamente: Aqui está a coisa mais preciosa - tua palavra; oculta no melhor lugar - em meu coração; com o melhor dos propósitos -para não pecar contra ti. Isso  foi feito pelo salmista com cuidado pessoal, como alguém que oculta  cuidadosamente seu dinheiro quando receia a presença de ladrões; neste  caso, o temível ladrão era o pecado. "Pecar contra Deus" é o conceito  cristão de mal moral; as demais pessoas só se preocupam quando ofendem  seus semelhantes. A palavra de Deus é o melhor preventivo para a ofensa  contra Deus, pois ela expressa sua mente e vontade e se propõe a levar  nosso espírito a conformar-se com o divino Espírito. Nenhuma cura para o  pecado na vida se compara a palavra na sede da vida, que é o coração.
Obtém-se uma agradável variedade de significado pondo a ênfase nas palavras 'tua' e 'ti'. Ele fala a Deus, ama a palavra porque ela é a palavra de Deus e odeia o pecado porque ele é pecado contra o próprio Deus. Se  porventura aborrece alguém, sua conclusão é que com isso ele ofendeu a  Deus. Se não provocamos o desprazer de Deus é porque entesouramos sua  própria palavra.
E também  digno de nota o modo pessoal como alguém temente a Deus faz isso: "De  todo meu coração te busquei." Seja o que for que outros escolham fazer,  ele já fez sua escolha e já colocou a Palavra nos recessos mais íntimos  de sua alma como seu mais desejável deleite; e se porventura outros  preferem transgredir, seu alvo é seguir após a santidade: "Para eu não  pecar contra ti." Isso não era o que se propusera fazer, mas o que já  havia feito. Muitos são ostensivos em prometer; o salmista, porém, fora  autêntico em concretizar; por isso esperava ver um resultado seguro.  Quando a Palavra está escondida no coração, a vida estará resguardada do  pecado.
O paralelismo entre a segunda oitava e a primeira ainda continua. O versículo  3 fala de não praticar iniqüidade, enquanto que este versículo trata do  método de não pecar. Quando formamos uma idéia de alguém abençoadamente  santo (v. 3), ela nos leva a fazer um ardente esforço para atingirmos a  mesma sacra inocência e divina felicidade; e isso só pode ocorrer  através de um coração piedoso alicerçado nas Escrituras.
[v. 12]
Bendito és tu, ó Senhor; ensina-me teus estatutos.
Bendito és tu5 ó Senhor. Estas  palavras de adoração são oriundas de intensa admiração pelo caráter  divino, o qual o escritor humildemente almeja imitar. Ele bendiz a Deus  por tudo o que lhe revelara e operara nele; ele o louvo com a calidez de  reverente amor e com a profundidade de santa admiração. Estas são  também palavras de percepção que emanam da consciência da profunda e  infinita felicidade de Jeová em seu interior. O Senhor é e deve ser  bendito, pois ele é a perfeição da santidade; e essa provavelmente seja  a razão por que isso é usado como uma súplica neste lugar, E como se  Davi dissesse: Vejo que de conformidade contigo meu caminho para a  felicidade foi encontrado, pois tu és supremamente bendito; e se em  minha estatura assimilei tua própria santidade, também serei  participante de tua bem-aventurança.
Mal chegou a palavra em seu coração  quando um ardente desejo veio à tona para assimilá-la e guardá-la.  Quando o alimento é deglutido, o próximo passo é digeri-lo; e quando a  palavra é rece-:io âmago da alma, a primeira oração é: Senhor, ensina-me  seu significado. "Ensina-me teus estatutos."; pois somente assim :  aprender o caminho da bem-aventurança. Tu és tão bem-aventurado, que  estou certo de que te deleitarás em abençoar outros; e imploro-te que  me dês esta dádiva a fim de que eu seja instruído em teus mandamentos.  As pessoas felizes geralmente sentem o maior prazer em fazer outros  felizes; e com toda certeza o Deus feliz se disporá em comunicar  santidade que é a fonte da felicidade. A fé inspirou esta oração e a  alicerçou, não em algo visto no homem orando, mas exclusivamente na  perfeição do Deus a quem se faz a súplica. Senhor, tu és bendito, por  isso abençoa-me com tua doutrina.
Precisamos ser discípulos ou aprendizes - ensina-me. Que  honra ter Deus pessoalmente como professor! Quão ousado é Davi em  suplicar ao Deus bendito que o ensine! Todavia foi o Senhor mesmo quem  pôs tal desejo em seu coração quando a sacra palavra foi depositada  ali, e portanto podemos estar certos de que ele não  se mostrou exageradamente ousado em expressá-la. Quem não se dispõe a  entrar na escola de tal Professor com o fim de aprender dele a arte do  santo viver? A este Instrutor devemos submeter-nos, caso queiramos  guardar de maneira prática os estatutos da retidão. O Rei que ordenou  os estatutos sabe perfeitamente seu significado, e visto serem eles o  produto de sua própria natureza, ele pode inspirar-nos melhor com o  espírito dos mesmos. A petição se impõe a todos quantos desejam  purificar seu caminho, visto ser ela muito prática e solícita por  instrução, não com base na erudição secreta, mas com base na lei na  forma de estatuto. Se porventura conhecemos os estatutos do Senhor,  então possuímos uma educação que é muitíssimo essencial.
Que cada um de nós saiba dizer: Ensina-me teus estatutos. Eis  aqui uma doce oração para ser feita a cada dia. Ela está a um passo do  versículo 10: "Não me deixes fugir", como este está a um passo do  versículo 8: "Não me desampares jamais." Sua resposta se acha nos  versículos 98-100: "Teus mandamentos me fazem mais sábio que meus  inimigos; porque, aqueles, eu os tenho sempre comigo. Compreendo mais  que todos meus mestres, porque medito em teus testemunhos. Sou mais  prudente que os idosos, porque guardo teus preceitos." Não, porém, até  que fosse repetido ainda pela terceira vez no "Ensina-me" dos versículos  33 e 66, para o quê solicitei a atenção de meus leitores. Mesmo depois  desta terceira súplica, a oração ocorre novamente em diversas palavras  nos versículos 124 e 139, e o mesmo anseio se aproxima do final do  Salmo, no versículo 171: "Profiram louvor meus lábios, pois me ensinas teus decretos." 
Nenhum comentário:
Postar um comentário