No último capítulo notamos que a conversão é feita de  arrependimento e fé. Isto então nos traz em nosso estudo à consideração  deles.  
 I. O ARREPENDIMENTO CONSIDERADO SÓ 
 1. AS PALAVRAS ORIGINAIS 
  Estas duas palavras numa só são “metanoeo” (sendo a forma  correspondente do nome “metanoia”)  e “metamelomai” (da qual a forma do  nome não ocorre em o Novo Testamento). Só a primeira palavra se associa  com a salvação. A última palavra é usada em Mat. 21:29 (no caso do filho  que primeiro recusou obedecer a seu pai, mandando-o trabalhar na vinha,  mas depois... arrependeu-se e foi”);  Mat. 21:32; 27:3 (no caso de  Judas); Rom. 11:29; 2 Cor. 7:8,10 e Heb. 7:21.  
  A respeito dessas duas palavras, diz Thayer: “Que” metanoeo “é o  termo mais amplo e mais nobre, expressivo de ação moral e  conseqüências, está indicado não só por sua derivação senão pela maior  freqüência do seu uso...”  
 2. DUAS ESPÉCIES DE ARREPENDIMENTO 
  Há um arrependimento evangélico e há também um arrependimento  legal. O arrependimento legal surge inteiramente através do temor das  conseqüências do pecado. Esta é a espécie que Judas provou. O  arrependimento evangélico é acompanhado de tristeza segundo Deus e se  opera no coração pelo Espírito regenerador  de Deus. É arrependimento  evangélico que ora consideramos nesse capítulo.  
 3. OS ELEMENTOS CONSTITUINTES DO ARREPENDIMENTO 
  (1). O pecado é reconhecido. 
  O homem deve ver-se a si mesmo como diferente de Deus e em  rebelião contra Deus. Deve ver a oposição que vai de sua condição com a  santidade de Deus. Deve ver que Deus detesta sua condição e seu estado. O  reconhecimento do pecado que entra no arrependimento para a salvação  tem a ver, primariamente, não com o fato que o pecado traz castigo senão  com o fato que o pecado ofende a Deus. Há, sem dúvida, um temor das  conseqüências eternas do pecado; o que não é, porém, a coisa primária.  
  Este reconhecimento do pecado é convicção e ele constitui o elemento intelectual do arrependimento. 
  (2). O pecado é lamentado e aborrecido. 
  A tristeza divina entra no arrependimento. Quando alguém se vê a  si mesmo como se fora diante de Deus, ele é trazido a lamentar o seu  pecado e a aborrecê-lo. Isto é o elemento emocional do arrependimento.  
  (3). O pecado é abandonado 
  Não é completo o arrependimento enquanto não houver uma  deserção íntima do pecado que conduz a uma mudança externa da conduta.  Isto é o elemento voluntário ou volitivo do arrependimento. Assim o  arrependimento concerne à inteira natureza interna: intelecto, emoção e  vontade. 
 4. O ARREPENDIMENTO É INTERNO 
  Ao passo que o arrependimento sempre se manifesta  exteriormente, contudo de si mesmo é interno, segundo o significado do  original. A Escritura distingue entre arrependimento e “frutos dignos de  arrependimento” (Mat. 3:8; Atos 26:20).  
 5. O ARREPENDIMENTO E A PENITÊNCIA CONTRASTADOS 
  A tradução católica romana da Bíblia (Versão de Douay)  substitui “arrependimento” por “penitência” como uma tradução de  “metanoeo”. Assim lemos pela Versão de Douay: “Fazei penitência, porque o  reino do céu está próximo.” (Mat. 3:2); “A menos que façais penitência,  todos igualmente perecereis.” (Lc. 13:5). “Testificando tanto a judeus  como gentios penitência para com Deus e fé em nosso Senhor Jesus  Cristo.” (Atos 20:21). E da penitência diz a Versão de Douay no  comentário a Mat. 3:2: “Cuja palavra, segundo o uso das Escrituras e dos  santos padres, não só significa arrependimento e correção de vida senão  também punição dos pecados passados pelo jejum e tais exercícios  penitenciais semelhantes.” Três coisas podem ser ditas a respeito deste  comentário:  
  (1). É absolutamente falso dizer que a “punição dos pecados  passados pelo jejum e tais exercícios de penitências semelhantes” é uma  parte do sentido da palavra grega. 
  Como já foi notado, a palavra grega significa uma mudança  interna. “O verdadeiro arrependimento consiste de emoções mentais e  emocionais, não de castigos externos auto-impostos. Mesmo a vida piedosa  e a devoção a Deus resultantes são descritas não como arrependimento  senão frutos dignos de arrependimento” (Boyce, Abstract of Systematic  Theology, pág. 384). “Metanoeo” é feita de “meta”, significando “depois”  e “noeo”, significando “perceber”, entender, meditar, ponderar,  considerar.”  
  (2). Nega a suficiência da satisfação de Cristo pelos nossos  pecados em franca contradição com a Escritura (Cf. Rom. 4:7,8; 10:4;  Heb. 10:14; 1 João 1:7).  
  Desde que Cristo fez inteira satisfação pelos nossos pecados,  não há para nós punição a aturar, exceto as conseqüências naturais do  pecado. Deus castiga o crente quando ele peca, mas Ele nunca o pune  tanto nesta vida como na vindoura. A punição é retributiva e está  baseada em “olho por olho e dente por dente”.  O castigo é corretivo e  está baseado no amor paternal. Cristo não nos deixou nada a pagar e nós  podemos cantar verdadeiramente:  
 Pagou-o tudo Jesus; 
 A Ele tudo devo na cruz. 
 Rubra nódoa o pecado deixou. 
 Lavando-a, alva como a neve ficou. 
  (3). Implica que os atos temporais da criatura podem expiar o pecado. 
  A Bíblia nada sabe de um tal ensino. Ela ensina que Cristo só  pode fazer uma expiação. Mesmo na eternidade as almas no inferno nunca  poderão expiar o pecado e por essa razão não há fim para a sua punição.  Então o cântico, seguramente, fala a verdade quando diz:  
  “Para sempre meu choro vertesse; 
 Sem folga meu zelo conhecesse; 
 Não poderiam meu pecado expiar, 
 Tu somente, Jesus, Tu deves salvar.” 
 6. O ARREPENDIMENTO É UM DOM DE DEUS 
  As três passagens seguintes provam isto:  
  “A Ele Deus exaltou com a Sua destra para ser Príncipe e  Salvador, para dar o arrependimento a Israel e remissão dos pecados.”  (Atos 5:31)  
  “Ao servo do Senhor não convém contender, mas sim ser manso  para com todos, apto para ensinar, sofredor; instruindo com mansidão os  que resistem, a ver se porventura Deus lhes dará arrependimento para  conhecerem a verdade” (2 Tim. 2:24,25). 
  “E quando ouviram estas coisas, apaziguaram-se e glorificaram a  Deus, dizendo: “ Na verdade, até aos gentios concedeu Deus o  arrependimento para a vida” (Atos 11:18).  
  O sentido disso é, simplesmente, que o arrependimento se opera  no homem pelo poder vivificador do Espírito Santo, como já o notamos.  
 II. A FÉ CONSIDERADA EM SEPARADO 
  Aqui temos a referência à fé salvadora; por isto notamos:  
 1. A FÉ SALVADORA DEFINIDA 
  A fé salvadora é confiança e firmeza no Senhor Jesus Cristo  como o Salvador pessoal de alguém e portador de pecados. E, desde que a  salvação inclui a santificação tanto como a justificação, a fé salvadora  alcança a entrega do ser a Cristo.  
 2. A FÉ SALVADORA DISTINGUIDA DE SUAS IMITAÇÕES 
  (1). Crença histórica 
  Isto é mera crença nos fatos da revelação como matérias de  história, incluindo a crença na existência de Deus e em que houve um  homem chamado Jesus que pretendeu ser o Filho de Deus. Pode ver-se  prontamente que semelhante crença não tem valor salvador. 
  (2). Assentimento intelectual 
  Isto sobe mais um degrau, trazendo aceitação mental das coisas  reveladas de Deus e Jesus Cristo. Assim, um que crê na existência de  Deus vem a crer nEle como sendo um ser segundo a Bíblia O revela ser e  um que crê que semelhante pessoa como Jesus viveu, vem a crer que Ele  era o Filho de Deus e que Ele morreu como um sacrifício pelo pecado.  Isto é um passo para a fé salvadora, mas não é ela mesma.  
  O campbelismo ensina que a fé salvadora não é nada mais que o  precitado. Ele se fia em passagens como 1 João 4:15 e 5:1. Mas estas  passagens devem ser compreendidas à luz de toda a outra Escritura e esta  certamente proíbe que a crença referida nessas passagens deveriam ser  entendida como sendo mero assentimento intelectual à deidade de Cristo. A  fé salvadora não é meramente mental (intelecto), mas do coração  (emoções). Vide Rom. 10:9,10. A crença de que se falou nas passagens  supra é tal como é produzida no coração por um conhecimento experimental  do poder de Cristo.  
  Dois fatos, então, quanto às circunstancias sob as quais estas expressões foram enunciadas, lançam luz sobre elas.  
  A.  O perigo de se professar crença na deidade de Cristo foi  tal nos dias apostólicos que ninguém o faria assim a menos que  impulsionado por verdadeira fé nEle.  
  B.  O cristianismo apresentou um tal contraste com o judaísmo e  paganismo que ninguém creria na deidade de Cristo sem verdadeira fé  nEle. Aqueles que não tinham esta fé considerariam a Jesus como um  impostor.  
 3. A FÉ COMO UM DOM DE DEUS 
  Isto está provado pelas passagens já citadas que designam o  arrependimento como um dom de Deus; porque, como veremos, o  arrependimento e a é são graças inseparáveis. Cada uma, quando aparece  só nas Escrituras, abraça a outra; porque, se isto  não fosse verdade,  as passagens que mencionam só uma ou outra, ensinavam que alguém possa  salvar-se tanto sem arrependimento como sem fé.  
  Isto também está provado por passagens que ensinam que a nossa  vinda a Cristo e crença nEle são o resultado da obra do poder de Deus.  Vide João 6:37,65; Efe. 1:19,20. Isto está ainda provado pelo fato que a  fé é um fruto do Espírito Santo (Gal. 5:22).  
 4. A FÉ NÃO TEM MÉRITO EM SI MESMA 
  A fé é meramente o canal através do qual a graça justificante e  santificante de Deus flui na alma. A Fé não é mais meritória do que o  ato de se receber um dom. A Fé não é de modo algum substituto de nossa  obediência à Lei, nem ela traz um rebaixamento da Lei de modo que  preenchamos suas exigências. A fé está uma vez  referida na Escritura  como trabalho (João 6:29), não que seja da Lei, mas somente que o homem  esteja ativamente engajado no seu exercício. “Como um dom de Deus e como  a mera tomada de misericórdia imerecida, está expressamente excluída da  categoria de obras sobre a base de que o homem pretenda salvação (Rom.  3:28; 4:4,5,16). Não é o ato da alma completa dar senão o ato da alma  vazia receber. Conquanto esta recepção seja movida por uma retirada do  coração para com Deus, ornada pelo Espírito Santo, está retirada do  coração ainda não é um amor cônscio e desenvolvido: semelhantemente amor  é o resultado da fé (Gal. 5:6)” (A. H. Strong, Systematic Theology,  pág. 469, 470).  
 5. A FÉ NECESSARIAMENTE SE EXPRESSA EM OBRAS 
  A fé é um princípio dinâmico. Ela ergue o amor e, portanto as  obras (Gal. 5:6). A fé que não se expressa em obras é uma fé morta, o  que é só uma outra maneira de dizer que é espúria ou irreal (Tia. 2:17).   
 6. A FÉ É DISTINGUIVEL DA ESPERANÇA 
  A fé e a esperança são muito aparentadas; mas ambos os termos  não são sinônimos. Fé e esperança diferem nas seguintes maneiras:  
  (1). Fé é confiança; esperança é expectação 
  A diferença aqui é estreita, mas é uma diferença tal como é  comum entre vários termos um tanto parecidos. Tanto a fé como a  esperança envolvem “a idéia de confiança, mas com o uso de preposições  diferentes” (Boyce). “Confiamos em” como um ato de fé. “Confiamos para”  em esperança.  
  (2). “A Fé é firmeza sobre algo agora  presente como conhecido  ou crido, Esperança está olhando pra diante, para algo no futuro”.  (Boyce).  
  (3). Cristo é o objeto da fé; ao passo que a salvação, liberdade do pecado, glorificação e céu são os objetos da esperança. 
  (4). A esperança resulta da fé e, portanto, não pode ser fé. Vide Rom. 5:2-6; 15:4-13; Gal. 5:5; Heb. 11:1. 
 7. O TERRENO DA FÉ 
  Cristo, objetivamente revelado à mente e ao coração, é o  alicerce da Fé. Está isto implicado em toda a Bíblia e está  iniludivelmente ensinado em Rom. 10:11-17. Lemos ali que “a fé vem pelo  ouvir” e ali também achamos a pergunta (implicando uma possibilidade):  “Como crerão naquele de quem não ouviram.” A Bíblia nada sabe,  absolutamente nada, sobre uma fé secreta, assim chamada, que pode  existir à parte do conhecimento de Cristo, tal como alguns cascaduras  ensinam.  
  No Velho Testamento Cristo foi revelado, não somente através de  tipos e sombras, mas por meio de profetas, tal como Isaias. E nos é  dito plenamente que o Evangelho foi pregado a Abraão e Israel (Gal. 3:8;  Heb. 4:2).  
 III. ARREPENDIMENTO E FÉ CONSIDERADOS JUNTAMENTE 
  O arrependimento e a fé são graças sincrônicas inseparáveis.  Temos aqui referencia, sem dúvida, a esse arrependimento (significado  por “metanoeo” e “metanoia”) que é  para salvação e não à espécie   (significado por “metamelomai”)  que Judas provou.  
  Que o arrependimento e a fé são sincrônicos ou simultâneos é  evidente do fato que, quando um homem é vivificado para a vida, não pode  haver lapso de tempo antes dele arrepender-se, nem pode haver qualquer  depois que ele crê. De outra maneira teríamos a nova natureza em  rebelião contra Deus e em incredulidade. Assim não pode haver ordem  cronológica em arrependimento e fé.  
  Uma outra coisa que mostra a inseparabilidade do arrependimento  e da fé é o fato que a Escritura muitas vezes menciona somente um de  ambos como o meio de salvação. Por causa deste fato devemos pensar de  cada um, quando usado separadamente, como compreendendo o outro.   
Digitalização: Daniela Cristina Caetano Pereira dos Santos, 2004
Revisão: Luis Antonio dos Santos – 10/12/05
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