22 de fev. de 2011

A Parábola o Trigo e o Joio



A Parábola do Joio 
Martinho Lutero 
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto
1
Propôs-lhes outra parábola, dizendo: O reino dos céus é 
semelhante ao homem que semeia a boa semente no seu campo; 
mas, dormindo os homens, veio o seu inimigo, e semeou joio no 
meio do trigo, e retirou-se. E, quando a erva cresceu e frutificou, 
apareceu também o joio. E os servos do pai de família, indo ter 
com ele, disseram-lhe: Senhor, não semeaste tu, no teu campo, 
boa semente? Por que tem, então, joio? E ele lhes disse: Um 
inimigo é quem fez isso. E os servos lhe disseram: Queres pois 
que vamos arrancá-lo? Ele, porém, lhes disse: Não; para que, ao 
colher o joio, não arranqueis também o trigo com ele. Deixai 
crescer ambos juntos até à ceifa; e, por ocasião da ceifa, direi aos 
ceifeiros: Colhei primeiro o joio, e atai-o em molhos para o 
queimar; mas, o trigo, ajuntai-o no meu celeiro. 
(Mateus 13:24-30, ACF) 
                                               
I. O próprio Salvador explicou essa parábola no mesmo capítulo, 
mediante solicitação de seus discípulos, e disse: O que semeia a boa semente, é 
o Filho do homem; e o campo é o mundo; e a boa semente são os filhos do 
reino; e o joio são os filhos do maligno; o inimigo, que o semeou, é o diabo; e 
a ceifa é o fim do mundo; e os ceifeiros são os anjos. Esses sete pontos de 
explicação compreendem e claramente apresentam o que Cristo quis dizer 
com essa parábola. Mas quem poderia ter descoberto tal interpretação, visto 
que nessa parábola ele chama as pessoas de semente e o mundo de campo, 
embora tenha, na parábola anterior a essa, definido a semente como sendo a 
Palavra de Deus e o campo as pessoas ou o coração das mesmas? Se Cristo 
mesmo não tivesse interpretado essa parábola, todo o mundo teria imitado a 
Sua explicação da parábola precedente, e considerado a semente como sendo 
a Palavra de Deus, e assim, o objeto e o significado pretendido pelo Salvador 
teria sido perdido. 
2. Permita-me fazer uma observação aqui, para o benefício do sábio e 
erudito que estuda as Escrituras. Imitação ou suposição não são permitidas na 
explicação da Escritura; mas a pessoa deveria e deve estar certa e firme. Assim 
como José em Gênesis 40:12s interpretou os dois sonhos do copeiro e do 
padeiro tão diferentemente, embora se assemelhassem, e não fez de um a 
cópia do outro. É verdade, o perigo não teria sido grande se a semente fosse 
interpretada como a Palavra de Deus; mesmo assim, tivesse esse sido o caso, a 
parábola não teria sido entendida corretamente. 
3. Ora, esse Evangelho nos ensina como o reino de Deus ou o 
Cristianismo acontece no mundo, especialmente por causa do seu ensino, a 
saber, que não devemos pensar que somente os cristãos verdadeiros e a pura 
doutrina de Deus habitarão sobre a terra; mas que deve haver também cristãos 
falsos    e hereges, para que os cristãos verdadeiros possam ser aprovados, 
como S. Paulo diz em 1Co. 11:19. Pois essa parábola não trata de falsos 
cristãos, que são tão artificiais em suas vidas, mas daqueles que são anticristãos em 
sua doutrina e fé sob o nome de cristão, que belamente 
desempenham o papel de hipócrita e causam danos. É uma questão da 
consciência, e não da mão. E eles devem ser servos muito espirituais para 
serem capazes de identificar o joio entre o trigo. E a suma de tudo é que não 
deveríamos nos maravilhar nem ficarmos aterrorizados, se entre nós se 
espalham muito falso ensino e falsa fé. Satanás está constantemente entre os 
filhos de Deus (Jó 1:6). 
4. Novamente esse Evangelho ensina como deveríamos nos conduzir 
para com esses hereges e falsos mestres. Não devemos extirpar, nem destruí-
los. Aqui ele diz publicamente para deixar que cresçam juntamente com o 
trigo. Temos a ver aqui apenas com a Palavra de Deus; pois nessa questão, 
aquele que erra hoje pode encontrar a verdade amanhã. Quem sabe quando a 
Palavra de Deus pode tocar o seu coração? Mas se ele fosse queimado na 
estaca, ou destruído de outra forma, poderíamos nos assegurar que nunca 
descobriria a verdade; e dessa forma, a Palavra de Deus é arrebatada dele, e se 
perde aquele que poderia ter sido salvo. Daí, o Senhor diz aqui, que o trigo 
também seria arrancado se fôssemos tirar o joio. Isso é algo terrível aos olhos 
de Deus, e nunca pode ser justificado. 
5. Disso observemos quão extremos e furiosos temos sido esses muitos 
anos, ao desejar forçar outros a crer; recebendo turcos com espada, hereges 
com fogo, judeus com morte, e erradicando assim o joio com o nosso próprio 
poder, como se fôssemos aqueles que podem reinar sobre os corações e 
espíritos, e fazê-los piedosos e justos, algo que somente a Palavra de Deus 
pode e deve fazer. Mas com assassinatos separamos o povo da Palavra, de 
forma que não possa operar sobre eles; e trazemos assim sobre nós mesmos 
um duplo assassinato, até onde reside em nosso poder, a saber, em que 
matamos o corpo no tempo e a alma na eternidade, e com isso dizemos que 
fizemos um serviço a Deus pelas nossas ações, e desejamos merecer algo 
especial no céu. 
6. Portanto, essa passagem deveria com toda razão aterrorizar os 
grandes inquisidores e assassinos de pessoas, mesmo que tivessem que lidar 
com verdadeiros hereges. Mas no presente eles queimam os verdadeiros 
santos e são eles mesmos os hereges. O que é isso senão arrancar o trigo, 
pretendendo estarem exterminando o joio, como pessoas loucas?  
7. O Evangelho que lemos hoje também ensina com essa parábola que 
nosso livre-arbítrio equivale a nada, visto que a boa semente é semeada apenas 
por Cristo, e Satanás pode semear apenas a semente do mal; como vimos 
também que o campo de si mesmo produz somente joio, que o gado come, 
embora o campo os receba e fique verde, como se fossem trigo. Da mesma 
forma, os falsos cristãos entre os verdadeiros não são de nenhuma utilidade, 
senão para alimentar o mundo e ser comida para Satanás, e são tão belamente 
verdes e hipócritas, como se fossem apenas os santos, e mantém o lugar na 
Cristandade que pertence a eles; e por nenhuma outra razão senão esta: eles se 
gloriam de ser cristãos e estar entre os cristãos na igreja de Cristo, embora 
vejam e confessem que vivem vidas ímpias. 
8. Nisso o Salvador retrata aqui também o espalhamento que Satanás 
faz de sua semente, enquanto o povo dorme, e ninguém vê que o fez, e 
mostra como Satanás se adorna e se disfarça para que não seja tomado como 
Satanás. Como experimentamos quando o Cristianismo foi plantado no 
mundo, Satanás colocou no meu meio falsos mestres. As pessoas pensam aqui 
com segurança que Deus está entronizado sem um rival, e que Satanás está à 
milhas de distância, e ninguém vê nada exceto como eles ostentam a Palavra, 
o nome e a obra de Deus. Esse curso se prova belamente eficaz. Mas quando 
o trigo cresce, então vemos o joio, isto é, se formos cuidadosos com a Palavra 
de Deus e ensinarmos a fé; vemos que ele produz fruto, então vagueia e o 
antagoniza, e deseja se assenhorear do campo, e teme que somente trigo 
cresça no campo, e seus interesses sejam ignorados. 
9. Então a igreja e o pastor se assombram; mas não lhes é permitido 
fazer julgamento, e avidamente desejam interpretar tudo como bom, visto que 
tais pessoas portam o nome de cristãos. Mas é evidente que elas são joio e 
semente perversa, se extraviaram da fé e caíram, confiando nas obras. Os 
santos lamentam por causa disso diante do Senhor, orando com sinceridade 
de espírito. Pois o semeador da boa semente diz novamente, eles não devem 
arrancar o joio pela raiz, isto é, devem ter paciência, e suportar tal blasfêmia, e 
encomendar tudo a Deus; pois embora o joio estorve o trigo, todavia, o 
primeiro torna o último mais belo de se contemplar, comparado com o joio, 
como S. Paulo também diz em 1Co. 11:19: “E até importa que haja entre vós 
heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vós”. Isso é 
suficiente sobre o texto de hoje. 
Fonte: Complete Sermons of Martin Luther, 
Volume 1, p. 10


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