18 de dez. de 2010

Justiça Muito superior a dos Fariseus - John Piper

Eu lhes digo que se a justiça de vocês não for muito superior a dos fa­riseus e mestres da lei, de modo nenhum entrarão no Reino dos céus.(Mateus 5.20),  (Mateus 23.27,28), (Marcos 7.21-23), (Mateus 5.8).

Jesus disse que não poderemos entrar no Reino dos céus se nos­sa justiça não for muito superior à dos fariseus e mestres da lei (Mateus 5.20). Essas palavras podem levar alguém a concluir que devemos esconjurar os fariseus. Eles eram os alunos mais aplicados -da lei mosaica e exigiam o cumprimento rigoroso de todos os seus detalhes. A tradição diz que havia 246 mandamentos positivos na Lei (os cinco primeiros livros da Bíblia) e 365 proibições. A voca­ção dos fariseus era defender e cumprir rigorosamente esses mandamentos. Será que Jesus quis dizer que devemos ser mais meticulosos em calcular o número de leis e ajustar nosso comportamento em torno delas?
John Stott responde:
Não é exagero dizer que os cristãos conseguem obedecer a cerca de 240 mandamentos, ao passo que os melhores fariseus talvez tenham conseguido chegar a 230. Não. A justiça cristã é maior que a justiça farisaica por ser mais profunda, por ser uma justiça do co­ração. [...] A justiça que agrada [a Deus] é uma justiça interior da mente e da motivação. Porque o Senhor vê o coração.
Essa é a resposta certa, mas, para compreendê-la claramente, preci­samos saber o que Jesus viu ao olhar para a justiça dos mestres da lei e dos fariseus. Não foi um quadro muito bonito.

Jesus e os fariseus: ira e súplica

Nenhum grupo despertou tanta ira e sofrimento no coração de Je­sus quanto os fariseus. Mateus 23 é o capítulo mais rigoroso dos Evangelhos. Contém críticas intermináveis contra os fariseus. Ape­sar disso, encerra com uma exposição do sofrimento no coração de Jesus: "Jerusalém, Jerusalém, você, que mata os profetas e apedreja os que lhe são enviados! Quantas vezes eu quis reunir os seus filhos, como a galinha reúne os seus pintinhos debaixo das suas asas, mas vocês não quiseram55 (v. 37). Essa manifestação de tristeza pelos fariseus também é expressa na parábola do filho perdido, na atitude do irmão mais velho. O irmão mais velho representa os fariseus e os mestres da lei, que reprovavam o fato de Jesus comer em companhia de pecadores. Os fariseus e os mestres da lei o criticavam: Este ho­mem recebe pecadores e come com eles (Lucas 15.2).
Jesus contou a parábola do filho perdido em resposta às críticas recebidas. A lição principal da parábola era esta: o fato de Jesus co­mer com os pecadores não significava cumplicidade de Deus com o pecado, e sim a busca de Deus pelos pecadores. No fim da parábo­la, Jesus atinge os fariseus. Descreve o pai (que representa a Deus) aproximando-se do farisaico filho mais velho e suplicando-lhe que participe da comemoração da volta do irmão mais novo. A parábola é uma oferta misericordiosa aos fariseus de participação na celebra­ção da graça na vida e no ministério de Jesus.
O irmão mais velho, porém, não quis trocar a posição irada de servo moralista pela posição jubilosa de filho: "Olha! todos esses anos tenho trabalhado como um escravo ao teu serviço e nunca desobede­ci às tuas ordens. Mas tu nunca me deste nem um cabrito para eu festejar com os meus amigos (Lucas 15.29). Ele se vê como servo merecedor, não como filho livre e amado. As últimas palavras do pai ao filho mais velho estão carregadas da tristeza que Jesus sentia pelos fariseus: "Meu filho, você está sempre comigo, e tudo o que tenhoé seu. Mas nós tínhamos que celebrar a volta deste seu irmão e alegrar-nos, porque ele estava morto e voltou a vida, estava perdi­do e foi achado (v. 31). O irmão, aparentemente, não quer festejar. Não ama a misericórdia. Quer ser tratado pelos próprios méritos, não pela misericórdia do pai. A parábola deixa o final em aberto. Os fariseus ali presentes devem atentar para o convite dirigido a eles. Jesus os acolherá na celebração da graça e da salvação se eles aban­donarem sua postura moralista e se alegrarem com a misericórdia.
Pelo que sabemos, poucos fariseus passaram por essa transfor­mação. Aparentemente, Nicodemos passou. Ele foi o fariseu que se aproximou de Jesus à noite para fazer-lhe perguntas e ouviu Jesus dizer: Ninguém pode ver o Reino de Deus, se não nascer de novo (João 3.3). Após a morte de Jesus, Nicodemos, "uma autoridade entre os judeus (v. 1), tomou uma atitude extremamente arriscada. Levou cerca de 30 quilos de uma mistura de mirra e aloés para re­verenciar o corpo de Jesus (João 19.39) e, com José de Arimatéia, proporcionou a Jesus um sepultamento digno. A Bíblia não men­ciona se Nicodemos se tornou discípulo; menciona apenas que José se tornou "discípulo de Jesus (Mateus 27.57). E difícil, porém, imaginar um fariseu assumir um risco tão grande sem que houvesse passado a crer em Jesus. Contudo, é um caso raro. A maioria dos fariseus foi inimiga de Jesus até o fim.
OS FARISEUS AMAVAM AS HONRARIAS, O DINHEIRO E O SEXO. 
O quadro que Jesus pinta dos fariseus é trágico e repulsivo. A raiz do problema é que o coração deles está muito distante de Deus. Jesus disse-lhes em Mateus 15.7,8:

Bem profetizou Isaías acerca de vocês, dizendo:
"Este povo me honra
com os lábios, mas o seu coração está longe
de mim.
O coração deles não amava a Deus; eles amavam dinheiro, os elo­gios e o sexo.
Depois de Jesus ter contado a parábola acerca do uso correto do dinheiro, em Lucas 16.1-9, os fariseus zombaram dele. Lucas escre­veu que eles "amavam o dinheiro53 (v. 14). Mais tarde, Jesus advertiu: "Cuidado com os mestres da lei. [...] Eles devoram as casas das viú­vas35 (Lucas 20.46,47). Eles criavam regras e preservavam tradições que faziam das doações ao templo uma desculpa para não ajudar os pobres, nem mesmo os parentes (Marcos 7.9-13). Ao revelar o que se passava no coração dos fariseus, Jesus afirmou que eles estavam "cheios de ganância e cobiça55 (Mateus 23.25). Apesar da esmerada religiosidade, eles não amavam a Deus: amavam o dinheiro.
Amavam também as honrarias humanas. A recompensa que bus­cavam pelo que faziam não era a comunhão com Deus, e sim a ad­miração dos outros. Jesus disse:
Tudo o que fazem é para serem vistos pelos homens. Eles fazem seus filactérios bem largos e as franjas de suas vestes bem longas; gostam do lugar de honra nos banquetes e dos assentos mais importantes nas sinagogas, de serem saudados nas praças e de serem chamados "rabis". (Mateus 23.5-7)
Esse apego aos elogios humanos torna impossível a fé genuína no auto-sacrifício de Jesus. Por isso, Jesus disse a eles: "Como vocês podem crer, se aceitam glória uns dos outros, mas não procuram a glória que vem do Deus único? (João 5.44). O coração deles não desejava a Deus como recompensa: preferiam ser honrados pelos homens.
Assim, como geralmente ocorre com os que são movidos pelo amor ao dinheiro e aos elogios humanos, os fariseus também esta­vam, ao que parece, quase sempre envolvidos com sexo ilícito. Jesus chama-osuma geração perversa e adúltera". 'Alguns dos fariseus e mestres da lei lhe disseram: "Mestre, queremos ver um sinal miracu­loso feito por ti. Ele respondeu: 'Uma geração perversa e adúltera pede um sinal miraculoso! (Mateus 12.38,39). Argumentei no mandamento 9 que essas palavras se referem, no mínimo, ao adulté­rioespiritual de Israel por não querer ter a Jesus como seu verdadei­ro marido. E natural, porém, supor que a palavra "adúltera" queira dizer que os "maridosalternativos não sejam apenas o dinheiro e as honrarias humanas, mas também o sexo ilícito. Quando o cora­ção não está profundamente maravilhado com a glória de Deus, em geral é movido pelos poderes deploráveis do dinheiro e dos elogios humanos.
Hipocrisia: a dissimulação ao cumprir a lei de Deus
Jesus considerava essa idolatria mais repulsiva ainda porque tudo vinha revestido de religiosidade. Era a essência do que ele chamou "hipocrisiaAi de vocês, mestres da lei e fariseus, hipócritas! Vocês limpam o exterior do copo e do prato, mas por dentro eles estão cheios de ganância e cobiça (Mateus 23.25). Limpar o exterior do copo refere-se a usar a lei de Deus para ocultar a rejeição a Deus. Essa atitude intensificou a ira de Jesus.
Ai de vocês, mestres da lei e fariseus, hipócritas! Vocês são como sepulcros caiados: bonitos por fora, mas por dentro estão cheios de ossos e de todo tipo de imundície. Assim são vocês: por foraparecem justos ao povo, mas por dentro estão cheios de hipocrisia e maldade. (Mateus 23.27,28)
São palavras fortes para descrever o coração dos fariseus: ganância, cobiça, ossos de cadáveres, imundície, hipocrisia e maldade. Tudo não passava de dissimulação ao cumprir à risca a lei mosaica.
Existe algo pior, todavia. No próximo capítulo, veremos alguns comportamentos que demonstram de falta de amor, resultado dessa forma de corrupção. Neste ponto, devo deixar claro que a justiça dos fariseus de nada vale para Deus. Devemos ter uma justiça que seja muito superior à que vemos nos fariseus.

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