28 de set. de 2010

O Deus que já não é mais Conhecido – A. W. Tozer

 


O mundo é mau, os tempos estão chegando ao fim, e a glória do Senhor desapareceu da Igreja como a nuvem de fogo saiu certa vez de cima da porta do Templo à vista do profeta Ezequiel.

O Deus de Abraão retirou de nós a Sua presença consciente, e outro deus a quem nossos pais não conheceram está se ambientando entre nós. Este deus foi feito por nós, e porque o criamos nós o compreendemos; porque o fizemos, ele não nos surpreende, nunca nos deslumbrará, nem nos deixará atônitos, nem transcenderá.
O Deus da glória por vezes Se revelava como um sol, a aquecer e abençoar, certamente; mas, freqüentemente sobrepujava, surpreendia e cegava antes de curar e dar visão permanente. Este Deus dos antigos quer ser o Deus da raça que veio após eles. Só precisamos preparar-Lhe habitação com amor, fé e humildade. Basta desejá-lO com todas as nossas forças, e Ele virá e Se manifestará a nós.

Permitiremos que um homem santo e refletido nos exorte? Ouçamos Anselmo, ou melhor, atendamos às suas palavras:

"Levante-se, homenzinho! Deixe por um pouco as suas ocupações, afaste-se um momento dos seus pensamentos perturbadores. Deixe de lado o fardo dos seus cuidados, e guarde para depois os seus negócios trabalhosos. Tome algum tempo para passar com Deus, e descanse nEle por um pouco. Entre na câmara interior de sua mente; desligue todo pensamento que não seja de Deus e daquilo que possa auxiliar você a buscá-lO. Fale agora, de todo o coração! Fale agora a Deus: Eu busco a Tua face. A Tua face, Senhor, eu buscarei."

De tudo que possa ser pensado ou dito a respeito de Deus, a Sua infinitude é a coisa mais difícil de compreender. Mesmo a tentativa de concebê-la nos parece contraditória, pois tal conceituação nos leva a tentar empreender algo que de início sabemos que jamais conseguiremos. Porém, temos de tentar, pois as Escrituras Sagradas nos ensinam que Deus é infinito e se aceitamos os Seus outros atributos, temos de necessariamente aceitar também este.

Não devemos desanimar em nosso esforço de compreender, pelo fato de o caminho ser difícil e não existirem auxílios mecânicos para a ascensão. A vista fica melhor quando alcançamos um lugar mais alto e a viagem não é para os pés e sim para o coração. Vamos buscar, portanto, "os transes da mente e as viagens do pensamento" que Deus deseja nos outorgar, sabendo que muitas vezes Ele dá vista aos cegos e fala às crianças de peito verdades jamais sonhadas pelos sábios e prudentes. Agora os cegos deverão ver e os surdos ouvir. Agora devemos esperar receber os tesouros encobertos e as riquezas escondidas em lugares secretos.

Infinitude significa algo sem limites, e para uma mente finita é evidentemente impossível compreender o Ilimitado. Neste capítulo sou forçado a pensar um passo para trás daquilo que estou escrevendo, e o leitor tem necessidade de pensar um grau menos do que aquilo sobre o qual está tentando pensar. Ó profundidade de riqueza, tanto de sabedoria como do conhecimento de Deus! Quão insondáveis os Seus juízos, e inescrutáveis os Seus caminhos!

Já sugerimos anteriormente a razão do nosso dilema. Es¬tamos tentando visualizar um modo de ser totalmente estranho a nós, diferente de tudo de que temos conhecimento no nosso mundo familiar de matéria, espaço e tempo.

Novaciano escreveu: "Aqui, como em todas as nossas meditações sobre as qualidades e o conteúdo de Deus, estamos além do nosso poder de conceituação; a eloqüência humana não sabe expor um poder comensurável com Sua grandeza. Na contemplação e exaltação de Sua majestade toda a eloqüência emudece, todo esforço mental desvanece. Pois Deus é maior do que a própria mente; Sua grandeza é inconcebível. Se pudéssemos imaginar a Sua grandeza, Ele seria menor que a mente humana que o concebesse. Mas Ele é maior que qualquer linguagem, e nenhuma afirmação poderá expressa-10; seria Ele menos do que a língua humana se através de uma expressão pudéssemos englobar e dizer tudo que Ele é. Nossos pensa¬mentos serão todos menores do que Ele, e nossas palavras mais elevadas serão triviais quando comparadas a Ele."

Infelizmente, a palavra infinito nem sempre tem sido usada com o seu significado preciso, sendo muitas vezes empregada para indicar "muito" ou "bastante", como quando dizemos que o artista toma infinitos cuidados com o seu quadro, ou uma professora tem uma paciência infinita com a sua aula. Corretamente, a palavra não poderá ser usada em relação a nenhuma coisa criada; só se aplica a Deus. Portanto, argumentar sobre o fato de o espaço ser ou não infinito é apenas um jogo de palavras. A infinitude só pode pertencer a Um. Não pode haver um segundo.

Quando dizemos que Deus é infinito queremos dar a idéia de que Ele não conhece limites. O que Deus é, e tudo que Deus é, Ele o é sem limite algum. Mais uma vez temos de nos desvencilhar do significado popular das palavras. "Riqueza ilimitada" e "energia sem medida" são outros exemplos do uso errado das palavras. Naturalmente, nenhuma riqueza é ilimi¬tada e nenhuma energia é sem medida, a não ser que estejamos falando da riqueza e energia de Deus.

Mais uma vez, dizer que Deus é infinito é dizer que não existe meio de medi-lo. As medidas são a maneira pela qual as coisas criadas dão conta de si mesmas. Elas indicam limita¬ções, imperfeições, e não poderão ser aplicadas a Deus. O peso indica a força de gravidade da terra sobre os corpos materiais; a distância mede os intervalos entre os corpos no espaço; o comprimento significa a extensão no espaço, e existem outras medidas conhecidas por nós que são usadas para líquidos, energia, som, luz e números para os múltiplos. Tentamos medir também as qualidades abstratas, e falamos de grande ou pequena fé, alta ou baixa inteligência, maior ou menor talento.

Não está claro que tudo isso não se aplica nem pode aplicar-se a Deus? É a maneira pela qual vemos as obras de Suas mãos, mas não a maneira como nós O vemos. Ele está acima de tudo isso, além e fora de tudo. Os nossos conceitos de medida abrangem homens e montanhas, estrelas e átomos, gravidade, energia, números, velocidade, mas jamais poderão medir a Deus. Não podemos falar de medidas e quantidade, e tamanho e peso, ao mesmo tempo em que estivermos falando de Deus, pois estes dizem respeito a graduações, e não existem graus em Deus. Tudo que Ele é, Ele o é sem crescimento ou soma, ou desenvolvimento. Nada em Deus é menos ou mais, grande ou pequeno. Ele é o que é em Si mesmo, sem qualificativos de pensamento ou palavra. É Deus, simplesmente.

No terrível abismo do Ser divino podem existir atributos dos quais não temos qualquer conhecimento e que não possuem significado algum para nós, assim como os atributos de misericórdia e graça não têm significado algum, pessoalmente, para os serafins ou querubins. Estes seres santos poderão saber destas qualidades de Deus, mas são incapazes de sentir simpatia por elas, pois nunca pecaram e assim jamais tiveram necessidade da misericórdia ou graça divina. Portanto, podem existir, e acredito que sem dúvida existem, outros aspectos da personalidade essencial de Deus que Ele não revelou nem sequer aos Seus filhos, remidos do pecado e agora iluminados pelo Espírito Santo. Estas facetas ocultas da natureza de Deus só concernem à Sua relação consigo mesmo. São como a face oculta da lua, que sabemos existir mas que nunca foi explorada e que não tem significado imediato para os homens na terra. Não há razão para tentarmos descobrir aquilo que não nos foi revelado. Basta saber que Deus é Deus.

Sempre enchendo o Teu próprio Ser
Com Tua chama auto-acesa,
Em Ti mesmo estás destilando
Unções incontáveis.
Sem a adoração das criaturas,
Sem velar as Tuas qualidades,
És, Deus sempre o mesmo!
FREDERICK W. FABER

Mas a infinitude de Deus pertence a nós e nos foi revelada para o nosso proveito eterno. Todavia, o que exatamente, ela significa para nós além da maravilha de pensar a esse respeito? Significa muito em todos os aspectos, e mais ainda, à medida que nos conhecemos melhor e aprofundamo-nos no conhecimento de Deus.

Porque a natureza de Deus é infinita, tudo que provém dela também o é. Nós, pobres criaturas humanas que somos, nos vemos constantemente frustrados pelas limitações interiores e exteriores a nós impostas. Os dias dos anos de nossas vidas são poucos, e mais velozes do que a lançadeira do tecelão. A vida não passa de um ensaio curto e febril de um concerto que não chegaremos a realizar. No momento em que pensamos ter alcançado alguma habilidade, somos obrigados a deixar de lado os nossos instrumentos. Simplesmente não há tempo suficiente para pensar, para tornar-se alguém, para realizar aquilo que a própria constituição de nossa natureza indica sermos capazes de fazer.

Como é plenamente satisfatório esquecer-nos completamente das nossas limitações e nos volvermos para um Deus que não as tem! Anos de eternidade se encontram no Seu coração. Para Ele o tempo não passa, permanece; e aqueles que estão em Cristo compartilham com Ele todas as riquezas do tempo sem limites e anos sem fim. Deus não tem pressa. Não tem de trabalhar contra o tempo. Só o fato de sabermos isso, pode aquietar o nosso espírito e relaxar os nossos nervos. Para os que se encontram fora de Cristo o tempo é uma fera devoradora; mas perante os filhos da nova criação, o tempo rasteja, ronrona e lhes lambe as mãos. O inimigo da antiga raça humana se torna amigo da nova, e as estrelas em seus cursos lutam pelo favor do homem a quem Deus se agrada em honrar. Esta a lição que podemos aprender da infinitude divina.

Mas há mais. Os dons de Deus na natureza têm as suas limitações. São finitas porque foram criadas, mas o dom da vida eterna em Cristo Jesus é tão ilimitado quanto Deus. O cristão possui a vida de Deus e compartilha com Ele da Sua infinitude. Em Deus há vida suficiente para todos e tempo suficiente para gozá-la. Tudo que possui vida natural segue o seu ciclo, desde o nascimento até a morte, e deixa de existir; mas a vida de Deus retorna a si mesma e jamais cessa. E a vida eterna é esta: conhecer o Deus único e verdadeiro, e a Jesus Cristo a quem Ele enviou.

A misericórdia de Deus também é infinita, e o homem que já sentiu o aguilhão lacerante da culpa interior sabe que isso é mais do que uma simples afirmação acadêmica. "Onde abundou o pecado superabundou a graça." O pecado que em tudo avulta é o terror do mundo, mas a graça abundante é a esperança da humanidade.

Por mais que o pecado permeie o mundo, ainda tem os seus limites, pois é o produto de mentes e corações finitos; mas o "muito mais" de Deus nos introduz à infinitude. Em oposição à nossa profunda enfermidade como criaturas, encontra-se a infinita capacidade de cura de Deus.

O testemunho cristão através dos séculos tem sido este: "Deus amou o mundo de tal maneira. . ." Resta-nos ver este amor à luz da infinitude de Deus. O Seu amor não tem medida. É mais do que isso: não tem limite algum. Não tem limites porque não é uma coisa e sim uma faceta da natureza essencial de Deus. O Seu amor é algo que Ele é, e porque Ele é infinito esse amor abrange em si mesmo todo o mundo criado, e tem ainda lugar para dez mil outros mundos além deste.

Este, este é o Deus, nosso adorável
Deus amigo fiel e imutável,
De amor tão grande quanto o poder;
O Deus que não tem fim, não tem medida.
Este é Jesus, o que era e há de ser,
Cujo Espírito guia a nossa vida.
Nós O louvamos pelo que é passado.
 E cremos no futuro em Si guardado.

JOSEPH HART

Nosso Pai Celestial: Permite que vejamos a Tua glória, mesmo que tenha de ser por detrás da fenda protetora da rocha e sob o abrigo da Tua mão. Não importa o preço em perda de amigos, ou bens, ou duração dos nossos dias, permite que conheçamos a Ti como Tu és, para que possamos adorar-Te como deveríamos. Por Jesus Cristo nosso Senhor. Amém.

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