3 de set. de 2010

As emoções são essenciais à vida cristã - J. Piper

 
As emoções são essenciais à vida cristã, não opcionais



Fico perplexo de ver que tantas pessoas tentam definir o cristianismo verdadeiro em termos de decisões e não de emoções. Não que as decisões não sejam essenciais. O problema é que exigem bem pouca transformação para serem concretizadas. Não são evidência de uma obra autêntica da graça no coração. As pessoas podem tomar "decisões" a respeito da verdade de Deus, com o coração longe dele.



Afastamo-nos muito do cristianismo de Jonathan Edwards. Ele apontou para 1Pedro 1.8 e argumentou que "a verdadeira religião, em boa parte, consiste em emoções":A quem, não havendo visto, amais; no qual, não vendo agora, mas crendo, exultais com alegria indizível e cheia de glória.



Edwards indica que "a verdadeira religião" gera duas coisas na alma dos santos, de acordo com esse texto: amor por Cristo ("aquém, não havendo visto, amais") e alegria em Cristo ("no qual [...] exultais com alegria indizível e cheia de glória"). Essas duas manifestações da alma são emoções, não meras decisões. O conceito de Edwards do cristianismo verdadeiro era que o novo nascimento realmente trazia à existência uma nova natureza com novas emoções ou sentimentos.



Vejo que há apoio para isso em toda a Bíblia. Temos a ordem de sentir, não apenas de pensar ou decidir. Temos a ordem de ter a experiência de dezenas de emoções, não apenas realizar atos da força da vontade. Por exemplo, temos a ordem de não cobiçar (Êx 20.17), e é óbvio que cada ordem para não ter certo sentimento também é uma ordem para sentir de certa maneira. O oposto de cobiça é satisfação com o que temos, e é exatamente isso que somos ordenados a experimentar em Hebreus 13.5 ("Contentai-vos com o que tendes"). É-nos ordenado que não guardemos rancor, mas que perdoemos "no íntimo" (Lv 19.17, 18; BLH "no coração"). Veja: a lei não diz: Tome a mera decisão de esquecer o assunto. Ela diz: Tenha uma experiência no coração (Mt 18.35). Do mesmo modo, a intensidade do coração é ordenada em 1Pedro 1.22 ("Amai-vos, de coração, uns aos outros ardentemente") e em Romanos 12.10 ("Amai-vos cordialmente uns aos outros com amor fraternal"). 

Veja alguns exemplos de emoções ou sentimentos que a Bíblia ordena que tenhamos:



Alegria (SL 100.2; Fp 4.4; lTs 5.16; Rm 12.8, 12, 15)

Esperança (SI42.5; lPe 1.13)

Temor (Lc 12.5; Rm 11.20; lPe 1.17)

Paz (Rm 5.1; Cl 3.15)

Zelo (Rm 12.11)

Tristeza (Rm 12.15; Tg 4.9)

Desejo (lPe2.2)

Compaixão (EÍ4.32)

Contrição (SL 51.17)

Gratidão (Ef 5.20; Cl 3.17)

Humildade (Fp2.3)



Não creio que seja possível dizer que passagens como essas se referem a enfeites opcionais de decisões. Elas foram ordenadas pelo Senhor que disse: "Por que me chamais Senhor, Senhor, e não fazeis o que vos mando?" (Lc 6.46).



É verdade que nossos corações com freqüência são meio obtusos. Não sentimos emoções com a profundidade ou intensidade apropriadas para com Deus ou sua causa. É verdade que, nessas horas, temos de, no que depender de nós, exercer nossa vontade e tomar decisões que, esperamos, reacendam nossa alegria. Apesar de o amor sem alegria não ser nossa meta ("Deus ama a quem dá com alegria!"), é melhor cumprir uma obrigação sem alegria do que não cumpri-la, desde que haja um espírito de arrependimento pela insensibilidade do nosso coração.



Com freqüência perguntam-me o que o cristão deve fazer se não sente alegria em obedecer. É uma boa pergunta. Minha resposta não é simplesmente continuar com seu dever porque os sentimentos são irrelevantes! Minha resposta tem três passos: primeiro, confesse o pecado da falta de alegria. Reconheça a frieza condenável do seu coração. Não diga que não importa como você se sente.



Segundo, ore com sinceridade para que Deus restaure a alegria da obediência. Terceiro, vá em frente e execute a dimensão externa da sua obrigação, na esperança de que a ação reacenda a alegria. Isso é muito diferente de dizer: faça sua obrigação, porque os sentimentos não importam. Esses passos são prescritos levando em conta que existe algo chamado hipocrisia.



Eles estão baseados na convicção de que nosso objetivo é a união de prazer e dever, e que justificar sua separá-lo é justificar o pecado. John Murray expressa isso assim: Não há conflito entre satisfazer o desejo e aumentar o prazer do ser humano por um lado, e cumprir o mandamento de Deus por outro. [...] A tensão que com freqüência existe em nós entre o senso de dever e a espontaneidade sincera é a tensão que brota do pecado e da vontade desobediente. Essa tensão jamais teria invadido o coração do homem não caído. E a atuação da graça salvadora tem por alvo retirar a tensão para que haja, como era no princípio, complementação perfeita de dever e prazer, de mandamento e amor.



Esse é o objetivo da graça salvadora.

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